quarta-feira, dezembro 29, 2010

Vem comigo, pela Tempestade.

Vem comigo. Sim. Não tenhas medo. Dá-me a tua mão. Eu levo-te comigo pela tempestade. Não tenhas medo. Se vieres comigo, mostro-te os recantos da tempestade que são iguais aos buracos que temos semeados pelo coração. Sim, eu conheço a tempestade. Eu sou da tempestade como de ti. Sou dos ventos e dos tornados como dos teus olhos. Não tenhas medo. Vem comigo furar a tempestade. Como se tudo fosse em vão. Como se não valesse a pena esperar pelo fim. Vamos. Abre os olhos. Vês, a tempestade? É por lá que vamos. Mesmo que haja chuva, e a água seja tão grande como o desespero. Se fores pela tempestade, eu vou contigo. Se quiseres, claro. Se quiseres um guia de tempestades. Ou alguém que dê pontapés aos trovões. Como se não houvesse nada mais a fazer. Eu sei que tens medo. Não faz mal. Eu tenho também. Tenho o teu e o meu medo atravassados na garganta. Não é por isso que vou deixar de correr para a tua tempestade como se corresse na esperança dos teus braços. Eu sei que não há esperança. Como não há braços à minha espera na tempestade. Mas, se me deres a mão, eu levo-te comigo pela tempestade. Até te mostrar que a tempestade tem um fim. Até perceberes que, se não tiveres medo, eu posso esconder o meu e mergulhar na tempestade na certeza de nunca mais voltar.

terça-feira, dezembro 14, 2010

e ao anoitecer


e ao anoitecer adquires nome de ilha ou de vulcão 
deixas viver sobre a pele uma criança de lume 
e na fria lava da noite ensinas ao corpo 
a paciência o amor o abandono das palavras 
o silêncio 
e a difícil arte da melancolia


Al Berto

segunda-feira, dezembro 06, 2010

o veneno de curar solidões

O teus olhos
cada vez que digo "o tempo" 
quando me apanhas distraído no teu sorriso
a gostar de ti sem querer.

Os teus sorrisos
cada vez que te respondo isto ou aquilo
como o mar e o céu em explosões
de apocalipses que ninguém percebeu.

As tuas mãos, tão perto
quando nos afastamos a fingir a indiferença
na serenidade deste inverno
nuclear como outro qualquer.

O mar. O céu.
As cores todas do fundo do tempo e da memória.
Os invernos de todos os tempos
condensados,
presos no teu sorriso cada vez que me começas a esquecer.

Tudo: o sangue, o tempo,
as tempestades de luz, e o mundo,
tudo, no teu olhar que tenta em vão explicar-me  o desamor.

O teu olhar, e a pena
a pena imensa de não sabermos sentir
mais que um par de sorrisos indiferentes,
neste inverno como noutro qualquer.

fantasia [ou a cúpula de gelo]

A chuva toda do tempo
como as lágrimas que gostava de ter para te dedicar;

A desolação de um coração vazio
como a solidão do império que nunca te conseguiu conhecer.

As cores de todos os invernos
azuis e brancos
cinzentos e brancos
transparentes e brancos.

A terra e os olhares infinitos
dos rostos sozinhos
perdidos de multidão em multidão.

descronologia da terra

a terra!
os cadáveres de todos os tempos;
o tempo sobre os corpos do tempo;
terra sobre os corpos,
corpos sobre o tempo,
tempo sobre a morte,
mutilada pelo tempo.

os amantes!
os amores todos de todos os mundos,
apodrecidos pela terra
esquecidos pela terra
entrelaçados com a morte
esquecidos pelo tempo.

a tortura!
escondida pela terra;
esmagada pelo terror do tempo
abraçado pela esperança ou pela morte;
soterrada na decomposição do tempo.

tempo sobre a terra
terra sobre terra,
morte sobre terra;
morte sobre o tempo.

sexta-feira, outubro 01, 2010

frescos de uma cidade distante

Deste-me um dedo de conversa para acender a paixão e partiste. Partiste mas continuaste aqui, na inocência homicida do teu sorriso, a semear confusões no meu coração atrapalhado.

Entretanto, a tua imagem entregou-se à transparência escura das ruas, de inverno em inverno, dedicada ao assalto inevitável dos que se perdem sem querer no encanto explosivo do teu decote.

E a cidade morre: o teu veneno confunde-se com o desassossego dos andaimes, que apontam para as estrelas sem saber que não há fuga possível deste altar de passeios e lama que habitas na esperança centrífuga do suicídio.

segunda-feira, setembro 20, 2010

Sonho Pop Escuro

Não partas.
(por favor)

Não me deixes perdido, assim,
a sacudir o desespero neurótico
ao ritmo da electricidade fulminante da fuga
do teu semi-sorriso.

O teu semi-sorriso no meu,
perdido,
alienado pelo sonho das tuas pernas descoberta

Não partas;
Eu continuo aqui,
atrás de ti, escondido nas tuas memórias morenas,
esmagado entre os clones imperfeitos da minha devoção decadente,
na espera eterna de uma noite só,
no encalço incessante do teu corpo molhado
no meu.

sábado, setembro 18, 2010

Queria lembrar-me de ti;
de como começavam as frases que pensávamos em metades.

Mas já não me resta nada.
Nem uma memória de paixão reciclada,
nem um gesto técnico de amor,
ou promessas falsas de intimidade.

Queria apenas uma memória,
adormecer a sonhar eternidades,
um gesto mesmo que pobre, de carinho;
ou quem sabe até, saudade.

domingo, agosto 01, 2010

a partida

"Hoje é a última noite que durmimos separados na mesma cidade.", escrevi-lhe. A carta ficou escondida para sempre, para não lhe complicar as nostalgias da partida nem os entusiasmos da chegada. Mas naquele momento, vinte e quatro horas antes de ela partir pela primeira vez, percebi que partia para sempre.

Hoje, passados meses das nossas partidas, sei de cor os continentes que nos separam. Ainda assim procuro-a, nas paredes e igrejas desta cidade que nem sequer é a nossa; que nem se parece com a cidade que não habitamos mais. Tento decifrar os sinais-códigos-enigmas dos olhares dos desconhecidos que sorriem com escárnio da nossa distância, que me despistam com indiferenças falsas, enquanto tento perceber nos sinos das igrejas as coordenadas espaciais do nosso desencontro.

Às vezes desisto. Explico-me que não te quero encontrar nunca mais e arriscar num possível encontro o fim de um sonho tão perfeito. Mas em dias como hoje, em que o peso da noite me faz ver-te para além da escuridão desta cidade em ruínas como se estivesses aqui, sei que não posso descansar enquanto não fizer explodir o sonho num pequeno beijo suícida.

sábado, julho 24, 2010

On the Road [The Original Scroll]

I had bought my ticket and was waiting for the LA bus when all of a sudden I saw the cutest little Mexican girl in slacks come cutting across my sight. She was in one of the buses that had just pulled in with a big sigh of airbrakes; it was discharging passengers for a rest stop. Her breasts stuck out straight and true; her little flanks looked delicious; her hair was long and lustrous black; and her eyes were great big blue things with timidities inside. I wished I was on her bus. A pain stabbed my heart, as it did every time I saw a girl I loved who was going the opposite direction in this too-big world. The announcer called the LA bus. I picked up my bag and got on, and who should be sitting there alone but the Mexican girl. I dropped right opposite her and began scheming right off. I was so lonely, so sad, so tired, so quivering, so broken, so beat, that I got up my courage, the courage necessary to approach a strange girl, and acted. Even then I spent five minutes beating my thighs in the dark as the bus rolled down the road. You gotta, you gotta or you'll die! Damn fool, talk to her! What's wrong with you? Aren't you tired enough of yourself by now? And before I knew what I was doing I leaned across the aisle to her (she was trying to sleep on the seat) and said, "Miss, would you like to use my raincoat for a pillow?" She looked up with a smile and said, "No, thank you very much." I sat back, trembling; I lit a butt. I waited till she looked at me, with a sad little sidelook of love, and I got right up and leaned over her. "May I sit with you, miss?" "If you wish." And this I did. "Where going?" "LA." I loved the way she said "LA"; I love the way everybody says "LA" on the Coast; it's their one and only golden town when all is said and done, "That's where I'm going too!" I cried. "I'm very glad you let me sit with you, I was very lonely and I've been traveling a hell of a lot." And we settled down to telling our stories. Her story was this: She had a husband and child. The husband beat her, so she left him, back at Sabinal, south of Fresno, and was going to LA to live with her sister awhile. She left her little son with her family, who were grape-pickers and lived in a shack in the vineyards. She had nothing to do but brood and get mad. I felt like putting my arms around her right away. We talked and talked. She said she loved to talk with me. Pretty soon she was saying she wished she could go to New York too. "Maybe we could!" I laughed. The bus groaned up Grapevine Pass and then we were coming down into the great sprawls of light. Without coming to any particular agreement we began holding hands, and in the same way it was mutely and beautifully and purely decided that when I got my hotel room in LA she would be beside me. I ached all over for her; I leaned my head in her beautiful hair. Her little shoulders drove me mad; I hugged her and hugged her. And she loved it. "I love love," she said, closing her eyes. I promised her beautiful love. I gloated over her. Our stories were told; we subsided into silence and sweet anticipatory thoughts. It was as simple as that. You could have all your Peaches and Bettys and Marylous and Ritas and Camilles and Inezes in this world; this was my girl and my kind of girlsoul, and I told her that. She confessed she saw me watching her in the bus station. "I thought you was a nice college boy." "Oh, I'm a college boy!" I assured her. The bus arrived in Hollywood. In the gray, dirty dawn, like the dawn when Joel McCrea met Veronica Lake in a diner, in the picture Sullivan's Travels, she slept in my lap. I looked greedily out tine window: stucco houses and palms and drive-ins, the whole mad thing, the ragged promised land, the fantastic end of America. We got off the bus at Main Street, which was no different from where you get off a bus in Kansas City or Chicago or Boston -- red brick, dirty, characters drifting by, trolleys grating in the hopeless dawn, the whorey smell of a big city.

sexta-feira, julho 16, 2010

Apresentação

Tenho um Obrigado que não cabe na memória de qualquer servidor ou sistema informático. Mas tenho que agradecer de uma maneira qualquer, e vocês começam a ser tantos que se torna impossível agradecer um a um, como evidentemente vocês merecem. Posto isto, aqui fica:

OBRIGADO!

Obrigado aos que foram à apresentação, aos que compraram o meu livro até agora (quase 100!!), aos que se interessaram, aos que estão a pensar comprar, aos que se estão nas tintas para o livro e ainda assim não desistem de me apoiar. A todos vocês, e mesmo a alguns que por lapso tenham sido excluídos, deste texto, mais uma vez, todas as vezes: OBRIGADO!


PS:
Quem estiver interessado em comprar uma cópia do livro e ainda não o tiver feito, deve contactar-me para Kordny@gmail.com ou 912601951, dado que o mesmo só chegará às livrarias sensivelmente em Outubro.

quarta-feira, junho 30, 2010

Apresentação


A apresentação do meu livro, "o sangue. Vem todo do coração terá lugar na Velha-a-Branca (Braga), no próximo dia 14 de Julho (Quarta-feira), a partir das 21h30.
Não faço a mínima ideia o que é que eu ou as outras pessoas vão dizer, mas à partida deve haver a leitura de alguns poemas para dar uma ideia do que está dentro do livro e eu devo dizer qualquer coisa bonita tipo "obrigado" ou qualquer coisa parecida.
No fim quem quiser pode comprar, pedir autógrafos, gozar comigo...essas coisas todas!

Aos mais impacientes, garanto que deve ser coisinha para não demorar muito mais de meia hora, até porque eu tenho compromissos de carácter inadiável (leia-se boémio) aos quais tenho que comparecer forçosamente...


Mais informações ainda em:

http://www.velha-a-branca.net

Kordny@gmail.com

+351 91 260 19 51

segunda-feira, junho 07, 2010

Na ressaca de um mais um livro

"No man is an island, entire of itself; every man is a piece of the continent, a part of the main. If a clod be washed away by the sea, Europe is the less, as well as if a promontory were, as well as if a manor of thy friend's or of thine own were: any man's death diminishes me, because I am involved in mankind, and therefore never send to know for whom the bell tolls; it tolls for thee."

John Donne, na introdução de "For Whom the Bell Tolls", de Ernest Hemingway


segunda-feira, maio 24, 2010

Capa: Versão Final

Aqui fica a versão final final da capa! A data de saída do livro deve ser anunciada nos próximos dias! ( :

quinta-feira, abril 29, 2010

A lua partiu
deitada num cobertor de cinzas
a cavalo com a legião de desencontrados
que povoa as ruas de néon desta cidade fantasma.

Tenho a certeza que, ao luar,
seria mais fácil esquecer o rasto de tentações que me assombra.
Mas os lobos atacam assim,
negros, sem olhos nem luar
escondidos na noite,
à espera de farejar o sangue doce da solidão.

Agora que espero a decomposição ácida dos nossos encontros no sossego
[do cimento da esperança,
e aguardo que os lobos devorem de vez as entranhas dos meus passo de
[melancolia,
tenho a certeza:

(e aquele lobo que destrói o meu fígado tem olhos de luar e paraíso)

- Com o luar tinha sido mais fácil querer sobreviver-te.

quinta-feira, março 25, 2010

A solidão encontrou-os assim,
frente a frente,
ela com uma lágrima no olho
ele com um medo do tamanho do munho a esconder-lhe as mãos.

A solidão juntou-os assim
ao longe, unidos pela distância
de quase impossíveis, ao sabor
de contratempos e desilusões
todas iguais.

A solidão levou-os assim,
perdidos, desviados para cemitérios
em primaveras que prometiam não ter fim.

Eles continuaram assim
juntos na solidão e no receio
itermitente, por vezes disfarçado,
de serem alguém.

quarta-feira, fevereiro 24, 2010

Há uma sombra.

Há uma sombra
no teu lugar à mesa, preenchido
pela Ausência.

Há uma sombra
no despedaçar ruminante dos momentos,
nos espaços vazios entre almoços
e jantares, em que esperamos por ti.

Há uma sombra
no vácuo que nos engole as palavras,
a disfarçar a indiferença impossível de estares longe.
Há uma sombra.

Há uma sombra
que nos cobre;
Uma sombra tenebrosa que nos lembra
que nenhum de nós viverá para sempre,
e tu também não.

sábado, fevereiro 20, 2010

Habemus Capa!

Já estou em condições de apresentar a versão final da capa do livro. Aqui fica. Aceitam-se opiniões! =)

sábado, fevereiro 13, 2010

Espaço Informativo #1

Dado que, aparentemente, o número de frequentadores mais ou menos assíduos deste espaço é afinal superior à meia dúzia - contra todas as minhas expectativas! - vejo-me forçado a reabrir o blog e a apresentar as minhas desculpas por ter sido obrigado a fecha-los nos últimos dias.
No entanto, a razão é bastante simples: resolvi finalmente aceitar um convite para publicar um livro de poesia. Dado que muito do conteúdo do mesmo se encontrava publicado neste espaço, tive que o suspender enquanto não tive tempo de apagar os materiais que serão incluídos no livro. Assim que tiver mais novidades, publica-las-ei aqui. A data de publicação esperada será algures no Verão deste ano, se tudo correr bem. Espero dentro de alguns dias poder dar uma espreitadela ao que será provavelmente a capa do livro. ;) Estejam atentos!


terça-feira, janeiro 12, 2010

Era tão bom viver nos anos 60, e acreditar ser um bocadinho menos estúpido do que agora. Ser-se hippy e ser legítimo ter a certeza que um dia podia ser tudo melhor, e que esse dia podia até ser amanhã. Não ter que ter medo, renegar o medo, ostracizar o medo. Quantos milhões de girassóis são precisos para cobrir a bomba de hidrogénio? Quantos milhões de pessoas fotocopiadas são necessárias para nos sentir-mos normais? Não vale a pena contar. Ou acreditar. E acabar enrabado numa valeta encharcada de chuvas e mijo, com um tubo metálico tão largo como uma bomba a rasgar-nos o cu ensanguentado. Ou então sozinhos. Mas que diferença faz? Deixamos o tempo avançar desumanamente porque nos esquecemos de lhe dar um bocadinho de humanidade. Não é ele de certeza o culpado pelos violadores de túmulos, mortos e velhinhas. O que é que vocês querem? O tipo continua estendido na estrada, com o rabo aberto em forma de flor vermelha, o tubo quase a empurrar-lhe as órbitas para fora, mas os carros não podem parar nem olhar, está verde e ninguém quer ouvir o tipo de trás buzinar, sair cá para fora com esta chuva toda e levar um tiro porque parou no amarelo e está a chover como o caralho. E o tipo está morto, enrabado ou não, pelo menos não sou eu. E há sopa em casa e é dia de futebol, e isso é que é importante.