quinta-feira, janeiro 25, 2007

As asas dos génios - Última pena

Será a imortalidade prémio suficiente para vidas que, segundo os padrões vigentes, tiverem pouco de felizes? Se a vida depois da morte existe, é provável que tal sacrifício valha a pena. No entanto não creio que as mentes mais brilhantes se deixem levar por um conceito tão redutor. Estarão agora do outro lado a sorrir enquanto escrevo estas palavras como tantos outros fizeram, sorrindo refastelados em toda a sua eterna glória. Ou então desapareceram mesmo para sempre, e a sua vida foi uma miséria. Não me enganam. Sei tão bem quanto eles que só há uma felicidade. A nossa.

Porque será que os génios parecem escassear cada vez mais nesta nossa humanidade? Estarão estes apenas escondidos, subavaliados, desaproveitados por uma sociedade que cada vez atenta menos ao individuo como peça única desta engrenagem cósmica? Ou estarão as potencialidades a ser cortadas de raiz quando se pensa estar a melhor a qualidade do ensino, da educação, do conhecimento? Poderão talvez estar apenas concentradas em áreas de menor notoriedade da vida social, poderá ter-se o conceito de genialidade tornado demasiado ambíguo para que seja usado com à vontade quando se referem pessoas ainda vivas ou demasiado presentes na história recente do nosso mundo. Pode ser tanta coisa. Ou então pode ser que os génios vivam apenas em lamparinas e tudo o que temos de fazer é esfregar as consciências para os ver nascer.

quarta-feira, janeiro 17, 2007

As asas dos génios - Segunda pena

A exploração da mão-de-obra infantil é um dos atentados mais básicos aos direitos humanos, consagrado na lei de qualquer Estado minimamente digno. Qualquer criança será portanto impedida de participar em qualquer actividade profissional até uma certa idade, 16 anos no caso do nosso país. Qualquer pai que tente usar o filho para proveito próprio ou para o seu sustento sendo este menor, cometerá um crime.

Quando Mozart era exibido nas cortes Germânicas e Austríacas com apenas 6 anos de idade, não estaria o seu pai a aproveitar-se do próprio filho para lucrar financeiramente com tão precoces e inauditas capacidades musicais? Não preferiria o pequeno Mozart jogar à bola, jogar à apanhada com os amigos como qualquer criança dita normal? O seu comportamento rebelde como adolescente aponta para que o pequeno prodígio tivesse realmente tanto apreço pelos prazeres típicos da sua tenra idade como qualquer outro rapaz. No entanto, se o pai Mozart não tivesse imposto ao filho a disciplina e o rigor, se não o apresentado às grandes cortes do centro da Europa, possivelmente este nunca ser teria transformado num dos maiores génios musicais de sempre.

sábado, janeiro 13, 2007

As asas dos génios - Primeira pena

"O indivíduo em consulta sofre de múltipla personalidade, assim como de indícios de esquizofrenia a que a primeira condição está muito provavelmente associado. Recomenda-se a medicação abaixo proscrita, administrada duas vezes ao dia, e permanente vigilância. Sendo os parentes incapazes de a providenciar, o Estado acolherá o paciente numa das suas instituições de modo a que o mesmo possa continuar a sua vida sem pôr em risco a sua integridade física nem a dos que o rodeiam."


Este diagnóstico, a ter sido feito, privaria a Humanidade de um dos seus grandes génios. Seria uma vida de clausura e intoxicação médica a que levaria Fernando Pessoa se nascido no século XXI, no seio de uma família dita “preocupada” com a saúde dos seus rebentos. Não que o diagnóstico estivesse errado. A desfragmentação da sua individualidade, tenha sido só criação ou facto decorrente da sua vida propriamente dita, é um dado adquirido, acima de quaisquer dúvidas e tido como vértice essencial da genialidade do poeta. Agora pergunto-me: Como reagiria um desses pais tão preocupados quando a professora de Língua Portuguesa lhe dissesse que o seu filho não só assinava com nomes diferentes os diversos trabalhos encomendados como também o conteúdo e os pontos de vista dos mesmos eram claramente díspares? A consulta num psicólogo seria uma questão de semanas, e a primeira ida ao psiquiatra uma questão de meses. Em grande parte dos casos.