Não me resta senão
escrever-te
na esperança que o próximo
verso te mate;
na esperança que estas
linhas,
esta tinta,
esta noite,
descubram no escuro
um sinal do fim;
uma réstia de cor,
o esboço de um futuro
que possa ainda
acontecer.
Um futuro sem forma
preenchido pela tua
ausência,
um tempo suspenso entre a
chuva
e a certeza de não poderes
existir mais
em mim
senão em forma de memória,
senão em forma de lage
plantada no cemitério
onde esta caneta te deixar
repousar.
As flores que te escrevo
sangram
suicidam-se, enforcam-se
pelas pétalas.
Estão secas de pólen
desfazem-se em poeira e
cinza
servem apenas como refúgio
dos insectos
contra a solidão.
Estes versos
anunciam a condenação,
a pena
perpétua do teu sorriso
criminoso,
incandescente,
exilado para
sempre
do meu.
Não me resta mais nada.
Entrego-me à noite.
Lá fora, os lobos anunciaram três vezes a morte da aurora.
As ambulâncias em pânico procuram em vão um simal do sol.
A noite é eterna
e prepara-se para nunca mais
acabar.
Fecho os olhos.
Lá ao fundo
um fio de luz.
Um rasto sépia,
um desenho inacabado
talvez um dia novo
ou quem sabe,
talvez,
o futuro a amanhecer.
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