terça-feira, outubro 02, 2012

A Revolução dos Renegados

De madrugada,
em qualquer cidade
sai à rua
o exército dos inconformados:

Vendedores de fantasias ambulantes,
armados até aos dentes
com espingardas fluorescentes;

Homens do lixo a carregar sacos cheios
de pólvora molhada em melancolia.

Soldados sem abrigo
a cerrar fileiras anarquistas à porta das igrejas desertas;

Legiões mercenárias de bêbados profissionais
a bater as ruas na espera incessante
dum sinal do inimigo invisível:

Prostitutas armadas com batôns e lâminas
de sonhos estilhaçados,
guardam a retaguarda
com convites armadilhados contra a solidão;

E, à sua frente

o grande líder
e o seu olhar amaldiçoado
pela esperança.

Dos seus lábios escorre sangue negro
em forma de verso.

Nas suas mãos, os ossos
partidos de todos os poemas
que ousaram invadir-lhes a noite infinita.

Aos seus ombros
o peso
da humanidade escondida
dos desalinhados.

Aos seus pés
os destroços das promessas
vazias dos habitantes lunares
do sol do meio dia.

Nas suas  costas,
os castigos marcados
dos bandidos, dos psicopatas,
os regicidas,
dos alienados.

Nas suas veias
a esperança revolucionária
abafada em álcool
e desencanto.

E no seu peito.
Ah, no seu peito!
o incêndio final
a chama absoluta
o punho imparável
de quem acredita por obrigação
na esperança roubada
nos sonhos exterminados
no futuro proibido dos renegados



[O dia do juízo final
aproxima-se.]



O exército aponta canhões
carregados de bombas
e ideias
aos  bastiões de mármore
dos conformados.

Não são feitos prisioneiros.
A revolução é definitiva,
a vontade
inabalável.

Em todos os bairros
a cidade arde.

O novo poder abole a covardia
subsidia as drogas
incita ao sexo imparável,
promove a líbido decisiva da liberdade.


Os impostos sobre os sonhos
são declarados ilegais
e uma nova constituição é redigida
em verso.


A oposição é abatida
a beijos, carinhos e flores.

Vendedores ambulantes distribuem novas fantasias
do alto dos seus novos carros
descapotáveis,
desfilando perpetuamente pelos sonhos reabertos
da cidade.

Os homens do lixo redistribuem esperanças,
que enchem como penas os seus sacos de plástico.

Os hotéis vazios são entregues aos sem abrigo
em sinal de agradecimento
e justiça.

Bêbados dançam pelos altares
das catedrais.

Putas funcionárias públicas
distribuem favores sexuais aos pensionistas
em troca de um soneto, uma cantiga
uma aquarela, ou companhia.


Da torre da igreja
o grande líder
vê a revolução instalada:
as flores, o sexo,
a música, o riso,
o tumulto embriagado da liberdade.

Do cima da torre
o poeta sorri de corda
ao pescoço,
deixando o peso do seu suicídio
fazer tocar  o sino, que
por fim,
anuncia a chegada definitiva
da felicidade.

1 comentário:

Anónimo disse...

Excelente, Brutal, Grande..., Parabéns!!!

Jorge, by LoboEscanzelado.
(04.02.2014 - 01h05m - Terça-feira.)