As páginas que ligam Florença ao resto do mundo são verdes:
um verde que encerra em si um milhão de outras cores
que o resto do mundo ainda não soube inventar;
todas elas diferentes, todas elas verdes:
verde esperança e primavera;
verdes áridos a sugerir valas comuns para os sonhos dos condenados;
verdes cinza, espalhados sobre a terra como o nevoeiro definitivo que prepara a chegada da tempestade e o fim da esperança;
verdes sorriso, como desenhos de flor e saudade;
verdes musgo de casa abandonadas ao mistério original da decomposição;
verdes eléctricos, explosivos, a impor alegrias estridentes aos corpos amputados de esperança que se arrastam eternamente pela escuridão do asfalto e da noite;
verdes artificiais, pintados no meio dos outros, como tumores arquitectónicos, a atormentar as paisagens perfeitas demais para não serem destruídas;
verdes borboleta;
verde rio ou verde mar;
verde fogo, verde cinza: verde saudade;
Desfilam todos vestidos a rigor:
uma procissão interminável de cores
todas elas verdes.
E, por detrás de todas elas,
no fundo de todas as cores,
no fundo de todos os verdes,
o verde atómico dos teus olhos apontados aos meus
a explicar-me todas as cores,
a decifrar esta esperança irredutível
que continuo sem saber explicar.
Florença está mesmo a chegar. Um último olhar descobre o arco íris verde que antecede a cidade. E, à chegada, a sucessão de contentores onde os sonhos são enterrados, na escuridão, a salvo da esperança verde que ameaça destruir a qualquer momento todos os nossos projectos megalómanos de solidão.
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